Thiago Kreutz e a obra para violão de Edino Krieger

Thiago Kreutz recebe os cumprimentos de Edino Krieger após o concerto
Thiago Kreutz recebe os cumprimentos de Edino Krieger após o concerto

Além da presença física dos dois maiores compositores brasileiros vivos, dialogando com o público do festival em grande demonstração de boa vontade (como contei aqui), o grande barato do Festival de Música Contemporânea Brasileira está sendo assistir às diversas apresentações musicais, com obras de Edino Krieger e Gilberto Mendes.

Entre estas apresentações, uma das mais marcantes ocorreu na quinta feira, dia 19, com Thiago Kreutz apresentando a obra integral para violão solo de Edino Krieger.

Thiago é provavelmente o maior especialista neste assunto no Brasil. Ele defendeu ano passado uma dissertação de mestrado sobre a obra para violão solo de Edino Kriger na UFGO (disponível aqui). E é claro que o concerto dele refletiu o trabalho minucioso e o profundo conhecimento da obra do compositor.

Mas provavelmente não seria suficiente Thiago ter feito um mestrado sobre a obra e conhecê-la com profundidade, se ele também não fosse um violonista de técnica soberba, firmeza nas execuções, som cheio e bem projetado, e grande capacidade de extrair variações timbrísticas e diferentes matizes do seu instrumento.

Quem ouviu Thiago Kreutz tocando no FMCB saiu convencido de que a obra para violão de Edino Krieger é um conjunto variado e de grande profundidade musical, com um agradável conhecimento idiomático num instrumento que normalmente é um desafio para compositores não violonistas. Talvez a obra de Edino Krieger deva ser situada no repertório violonístico no mesmo nível de grandeza que a obra de Guerra Peixe, ambas apenas um pouco abaixo do nível de excelência atingido na produção de Villa-Lobos.

Embora nestes casos a gente nunca saiba exatamente qual o grau de responsabilidade no resultado final cabe ao compositor e qual cabe ao intérprete. É certo que, talvez com exceção da Ritmata, de 1974, que é uma das obras mais importantes do repertório mundial do instrumento, Edino Krieger merece ter sua obra mais conhecida e tocada por violonistas. Fica difícil determinar até que ponto o resultado que ouvimos convence pela técnica soberba de um dos nossos maiores compositores ou deriva do grau de “convencimento” atingido pela musicalidade que Thiago Kreutz imprimiu a cada uma das obras. De qualquer modo, obras musicais só existem de fato quando são tocadas, e nada melhor do que serem bem tocadas, para revelar toda sua profundidade.

Foi esse o repertório:

Preludio (1955)

Ritmata (1974)

Romanceiro (1984)

Passacalha para Fred Schneiter (2002)

Alternâncias (2008)

A execução completa dura pouco mais de 20 minutos, e ao final do post tem um vídeo de Thiago tocando em outra ocasião o mesmo repertório. No vídeo não é possível ter a dimensão exata de tudo que digo, pois a captação do áudio não é profissional. Entretanto fica como um possível exemplo do domínio que Thiago demonstra deste repertório.

Na execução que assisti, diria que só não foi perfeita a Ritmata, onde alguns trechos rápidos não saíram como deveriam. Entretanto essa é a sina do concertista: ou toca burocraticamente e acerta todas as notas, ou extrai o máximo da música, e coloca corajosamente seus enunciados estéticos, arriscando a incursão em imperfeições técnicas de momento, especialmente nas obras mais difíceis. Thiago claramente opta pelo caminho dos grandes músicos, e nos deu uma visão magistral e muito convincente da obra de Edino Krieger.

O detalhe é que, pela dinâmica do FMCB, difícil as coisas poderem se diferentes. O concerto não foi realizado num ambiente hermético que às vezes se dá quando todas as atenções estão voltadas para aquela execução. Um pouco do barulho externo do Instituto de Artes da UNICAMP e dos próprios participantes do evento, que ficaram o dia inteiro no auditório, ouvindo uma maratona de comunicações e concertos.

Maratona da qual Thiago participou por inteiro, inclusive apresentando uma comunicação de trabalho científico na parte da manhã. As duas coisas se completaram perfeitamente: o panorama analítico das obras apresentado na palestra de manhã, a execução magistral das mesmas no concerto de tarde.

Na foto que ilustra o post, Thiago recebe os aplausos do público e o agradecimento especial do compositor.

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