O Centro de Convenções de Curitiba resolve o problema da Orquestra Sinfônica do Paraná?

OSP em apresentação didática no Canal da Música (foto de Karin van der Broocke,  no sítio do Teatro Guaíra )
OSP em apresentação didática no Canal da Música (foto de Karin van der Broocke, no sítio do Teatro Guaíra)

Matéria de ontem na Gazeta do Povo informou que o Governo do Paraná vai transformar o Centro de Convenções de Curitiba na nova casa da Orquestra Sinfônica do Paraná.

Pelo que deu pra entender da matéria, parece que o governo do estado anunciou o remendo como se fosse uma grande solução. Não é não. Na matéria tem uma fala do maestro Osvaldo Ferreira, que pareceu empolgado com o anúncio, acreditando que significará um avanço para as difíceis condições de trabalho do nosso conjunto orquestral que ele dirige com entusiasmo. Mas a matéria teve o cuidado de ouvir os músicos, que colocaram grandes reticências a respeito da tal “nova casa”.

A questão é que a orquestra não tem espaços adequados para ensaio, chegando a ser impossível fazer ensaio de naipe, como conta o trompetista ouvido pelo jornal. A verdadeira solução passaria por uma profunda reforma dos espaços do Teatro Guaíra, coisa que não é fácil.

Para não deixarmos morrer a nossa memória tão raquítica, vamos lembrar o descaso de todos os nossos governos estaduais com a política cultural e os espaços de fruição na capital de um dos estados mais ricos do país. Jaime Lerner, que governou entre 1995 e 2002, por dois mandatos consecutivos, não fez nada para manter ou atualizar o espaço da orquestra nem sua programação. Construiu o caro Canal da Música, que desde então vem sendo subutilizado, seja por inadequação do projeto, seja pelo fato de que a cartilha liberal pela qual Lerner rezava dizia que se pode gastar com investimento (construir prédios) mas não com custeio (os equipamentos e o pessoal necessário para os prédios funcionarem). Assim, a contabilidade dos cabeças de planilha pode ostentar não-sei-quantos-milhões em construções, mas não contrata um único ser vivente para tornar as construções algo úteis ou funcionais. Na mesma toada, o apagar das luzes do seu governo foi marcado pela construção das novas instalações do Museu Oscar Niemeyer.

Veio o governo Requião, 2003-2010, também de dois mandatos seguidos, que já tinha comandado o estado em 1991-1994. E nada melhorou. Ou ao menos não o necessário. A OSP ficou paralisada por alguns meses enquanto o governo se dava ao trabalho de passar o pente fino em todos os contratos da administração anterior. Atitude louvável, alguém poderia dizer, exceto pelo fato de o governo Requião foi um zero à esquerda para a cultura paranaense, e a orquestra ficou à míngua pelos 8 anos de seus dois mandatos.

O Canal da Música seguiu subutilizado, o Teatro Guaíra seguiu em acelerado processo de decadência de sua estrutura física, os corpos estáveis do estado foram praticamente dizimados por falta de orçamento, de estrutura, de direção política. Somos um estado que gosta de se dizer culto, que gosta de ostentar a fama de ser um centro de música clássica, e etc. Tudo mentira da grossa. A Orquestra esteve à beira da morte por anos e não se viu reclamação significativa. Os espaços culturais estão decrépitos e ninguém lamentou.

Justiça seja feita, ao menos uma coisa aconteceu no governo Requião: o Museu Oscar Niemeyer recebeu condições financeiras e programação digna. Mas não nos esqueçamos que ele estava sob o comando da primeira dama Maristela Requião, e que centralizou todas as verbas públicas e o patrocínio das estatais (principalmente a COPEL, que o Lerner quis privatizar, com apoio do então deputado Beto Richa, mas não conseguiu comprador numa época de vacas magras na BOVESPA). Ou seja, o MON cresceu e viveu vampirizando todo o restante da vida cultural do Estado.

Por exemplo o Museu de Arte Contemporânea, cujo acervo foi deslocado para o MON pois estava em deterioração criminosa. O Museu da Imagem e do Som (MIS) também está em lugar provisório há anos, com o valioso acervo severamente ameaçado. Seu prédio histórico costumava ser uma antiga delegacia de polícia, situada em frente ao atual Centro de Convenções (antigo cinema). Hoje o MIS está situado fantasmagoricamente na antiga sede do BANESTADO no Santa Cândida (este o Lerner conseguiu entregar à banca privada, depois de fazer festa com seus recursos), sem funcionários e sem condições ou instalações adequadas.

Mas o assunto é o Guaíra e a OSP. Voltemos a ele.

A questão é que o Governo Beto Richa, iniciado em 2011, já passou da metade e ainda não vem conseguindo dar novos rumos à pasmaceira dos governos anteriores. É certo que a vida da OSP melhorou muito. Já tem programação regular, que vem sendo anunciada com antecedência, e é coisa da melhor qualidade. Ou, ao menos, é o que de melhor qualidade se pode fazer sem investir nada. O maestro Osvaldo Ferreira poderá entrar para os anais da criatividade cultural por conseguir fazer uma orquestra render tanto em tão péssimas condições de atuação. Aliás, lá nos bastidores do Teatro Guaíra se sabe que a programação 2013 da OSP já estava pronta em meados do ano passado, mas só foi confirmada no início do ano corrente, por que primeiro era preciso confirmar a locação de espaços do Guaíra e a consequente disponibilidade de datas.

O negócio é esse mesmo que você está lendo. O governo do estado tem um Teatro enorme, de importância capital e histórica, este teatro é a casa da orquestra mantida pelo estado, mas as instalações não servem para a orquestra, e ela não pode definir sua programação antes de saber se o Teatro vai ou não alugar as datas para formaturas e shows diversos, colocados na mão de produções privadas.

Agora, ao invés de investir numa reforma urgente e mais do que necessária, garantindo o espaço adequado para os grupos artísticos que ali trabalham (principalmente a Orquestra e o Balé), o governo anuncia para 2014 que a orquestra poderá ensaiar no Centro de Convenções de Curitiba.

Em julho de 2014 o espaço será fechado e reformado para adequar os espaços à Orquestra.

Bem, então significa que o atual governo está jogando a questão para o próximo. Contando, é claro com uma reeleição em 2014, mas isso deve ser deixado a cargo de sua majestade o eleitor. Que acaba de sofrer um golpe espertalhão. Depois não sabem porque nossa classe política anda tão desacreditada.

Eu lembro quando o novo governo assumiu, e rapidamente deu novo alento à Orquestra, trazendo o maestro Osvaldo Ferreira para o comando, após o êxito de suas atuações na Oficina de Música de Curitiba, na gestão de Paulino Viapiana na Fundação Cultural de Curitiba, alçado à Secretaria de Cultura do Estado com a eleição para governador do ex-prefeito Beto Richa. Na ocasião, anunciou-se que a orquestra ensaiaria no Canal da Música, como informava a reportagem da Gazeta do Povo.

Isso nunca aconteceu, nem poderia, pois lá não há espaço adequado para uma orquestra ensaiar, nem muito menos se apresentar em concerto.

Segue o mesmo problema com o Centro de Convenções, que não resolve a situação da falta de espaço. Hoje no Teatro Guaíra não há local adequado de ensaio, e já vi músico da orquestra estacionando no Círculo Militar em dia de concerto. Estamos falando de um centro antigo da cidade, com vários problemas de urbanização. Não temos em vista nenhuma solução adequada, só remendos e adiamentos anunciados como se fossem maravilhas.

Pensar em alguma coisa como uma “Sala São Paulo” por estas bandas é ago impossível. Seguimos vivendo de estrutura precária, sem planejamento para o futuro, sem projetos e sem soluções. Será que alguém ainda acredita que Curitiba é a capital da música clássica?

P.S. veja todas as vezes que a OSP foi assunto nesta página:

A programação 2011 da Orquestra Sinfônica do Paraná

A temporada 2012 da Orquestra Sinfônica do Paraná

Osvaldo Ferreira e a Sinfônica do Paraná: a Sinfonia nº 2 de Mahler

Osvaldo Ferreira e a Sinfônica do Paraná com Fábio Zanon: Krieger, Rodrigo e Debussy

A Sagração da Primavera de Olga Roriz com o Balé Guaíra e a Sinfônica do Paraná

Orquestra Sinfônica do Paraná é uma das 5 melhores do Brasil?

Stefan Geiger, a Sinfônica do Paraná e o filme de Lotte Reiniger com música de Wolfgang Zeller

Homenagem aos 85 anos de Edino Krieger: Osvaldo Ferreira e a Sinfônica do Paraná

Comentários

3 respostas para “O Centro de Convenções de Curitiba resolve o problema da Orquestra Sinfônica do Paraná?”

  1. Avatar de Carlos A Monteiro
    Carlos A Monteiro

    De pleno acordo, o tradicional teatro Guaíra é a casa da orquestra, e ao estabelecer a agenda de shows do mesmo, deveria ser dada a importância que a orquestra merece, alem de ajustar as reivindicações para os ensaios. De nada adiantará desativar outro órgão, pois pelo visto não atenderá as necessidades da mesma.

  2. Avatar de Valéria Prochmann
    Valéria Prochmann

    A obra de reforma geral do Teatro Guaíra está finalmente em curso. No momento está sendo feito o projeto, em seguida será realizada a obra. É um investimento de grande monta que está sendo realizado pelo atual governo, considerando o déficit de anos a fio sem conservação adequada do imóvel. A atual gestão também promove a reforma da Biblioteca Pública do Paraná.

    1. Avatar de André Egg
      André Egg

      Pois é. Tem que avançar nisso aí. Ainda mais que a gestão de Beto Richa na prefeitura ficou marcada pela reforma dos espaços culturais do município. Tinha que levar isso pro governo estadual também.