Osvaldo Ferreira e a Sinfônica do Paraná com Fábio Zanon: Krieger, Rodrigo e Debussy

O compositor Rogério Krieger

A foto é de Daniel Castellano para a Gazeta do Povo (via Gazeta Maringá)

Foi um bom concerto, nem tão impressionante para um concerto comemorativo de aniversário da orquestra, mas certamente uma noite muito agradável.

A peça Motus Sinfonicus de Rogério Krieger, sobre a qual já comentei por ocasião do concurso de composição da UFPR/Teatro Guaíra ano passado, se não é uma peça para prêmio em concurso, justamente por sua linguagem mais conservadora, certamente é peça para figurar no repertório normal das orquestras. Ainda mais da orquestra da cidade onde o compositor atua, e sendo ele um dos violinistas em ação. A peça não é chocante, genial nem ousada, mas é muito bem escrita. Aliás, as cordas especialmente tocaram com gosto, afinação perfeita e sonoridade muito expressiva. Peça para os músicos tocarem com sorriso nos lábios. E repito: é sempre muito bom ver uma peça em que o compositor está presente para receber os aplausos. Melhor que muita bobagem clássica de antanho que se toca por pura preguiça de renovar o repertório.

Depois veio o Concierto de Aranjuez, forte concorrente a música mais ouvida de todos os tempos. A atração era ver a peça ao vivo (certamente todo mundo já ouviu em disco, eu mesmo quase furei os discos que tinha) e, especialmente, com um dos maiores solistas de violão em atividade.

A peça também é uma coleção de belíssimas melodias, bem funcional para a orquestra, apesar de a instrumentação ser pesada demais para o instrumento solista, exigindo amplificação. Talvez a amplificação não fosse necessária num teatro menor. O problema da amplificação é que ela amplifica mais os ruídos indesejados do violão do que quase o som proposto na partitura. E Fábio Zanon certamente já tocou melhor este concerto em outras oportunidades.

Ele já deve estar enjoado de tocar isso. Sua carreira europeia começou justamente com a oportunidade de substituir de última hora um solista impossibilitado de tocar na Inglaterra. Ter o concerto de cor foi o diferencial entre continuar desconhecido e ganhar um contrato. Aranjuez é um problema terrível, porque tem passagens bem difíceis, e há muitas gravações para se comparar. Eu devo ter ouvido isso com quase todos os violonistas que já gravaram. Certamente John Williams fez a gravação com menos erros. Juliam Bream a mais expressiva. Pepe Romero tinha os melhores rasgueados. Eu colocaria o Zanon meio que na escola do Juliam Bream: tipo, não importa errar uma ou outra nota, o importante é tirar o som mais bonito possível, ser expressivo nas passagens mais importantes e dar uma coerência musical ao todo da peça. Neste sentido, ver o Zanon tocando é de encher os ouvidos. Mais do que um solista virtuose (que ele também é – suas escalas rápidas mostraram isso), um grande músico.

O bis que Zanon deu solo (não sei qual era a peça) foi ainda mais impressionante, mostrando porque ele é um dos violonistas mais requisitados nos palcos do mundo de hoje. Um som poderoso, e uma expressão musical soberba.

Por fim La mer, de Debussy. Talvez uma das peças mais influentes do repertório sinfônico, toda cheia de efeitos de orquestração. De novo, uma peça que todo mundo já ouviu zilhões de vezes, mas que valia a pena ouvir ao vivo.

O concerto era comemorativo do aniversário da orquestra. Aproveitou-se a ocasião para homenagear uma das musicistas que esteve na OSP desde a fundação, em 1985. Foi o último concerto de Maria Luiza Gomes na estante das violas, se entendi bem, aposentando-se. Justa homenagem, especialmente se pensarmos que cada um dos músicos de estante é totalmente responsável por fazer a orquestra soar tão bem.

Entretanto, me pareceu falta de compromisso com a história da orquestra e da cidade sequer mencionar os nomes de Alceo Bocchino e Osvaldo Colarusso, que carregaram a batuta desde a fundação. Se não era possível que eles estivessem no pódio, como eu acho que seria o ideal, que ao menos fossem lembrados na homenagem. [Veja o texto que escrevi sobre isso no meu blog no portal Gazeta do Povo]

Talvez justificando a falta de tato da administração do Teatro Guaíra, ou de sei lá quem, Osvaldo Ferreira fez um pequeno discurso destacando que o importante é a perenidade da orquestra, e não as pessoas que estão à frente. Nisso ele está certo, a orquestra é uma coisa da cidade, é uma história que está só começando, e não pode ficar a serviço de glórias pessoais. Entretanto, a justa homenagem à memória dos que fizeram acontecer a vida cultural que hoje usufruímos não pode ser negada. Certamente daqui a alguns anos Osvaldo Ferreira será lembrado pelo trabalho que vem fazendo à frente da orquestra, dando-lhe novo dinamismo e garantindo uma programação respeitável. E daqui a alguns anos também será injusto comemorar o aniversário da orquestra sem mencioná-lo. Espero.

Veja também meu comentário sobre a programação completa da OSP no ano.