Luiz Claudio Ribas Ferreira e o Quarteto Ars no Teatro Positivo

Texto antigo, publicado originalmente em 24/09/2007

Assisti a um concerto da série domingo no campus, no teatro da UNICENP, ontem às 11:00 horas. Foi comemorativo aos vinte anos do lançamento do primeiro disco de Luiz Claudio Ribas Ferreira, professor da EMBAP e um dos grandes violonistas deste planeta. O concerto teve uma parte solo com Luis Claudio e outra com o quarteto Ars, integrado pelo próprio e seus pupilos Fabrício Mattos, Alisson Alípio e Hestevan Prado.

Foi um carinho nos ouvidos da grande audiência presente. Repertório primoroso e execuções magistrais. Mostraram a riqueza maior do violão: sensibilidade demonstrada na incrível gama de timbres que o instrumento oferece. Boa acústica do teatro, bons instrumentos nas mão de bons executantes. Mesmo sendo um amplo teatro, não é necessário amplificação. O violão não é dos instrumentos de maior potência sonora, mas foi feito para soar acústico – e assim deve ser.

A primeira parte do concerto teve peças dos três discos já lançados por Luis Claudio. Do primeiro, ainda em vinil, de 1987, foram tocadas duas peças da Suíte op. 47 de Albeniz. Originais para piano, são peças já incorporadas ao repertório violonístico. Mas fica sempre para mim a impressão de que o esforço para fazer tudo (ou quase tudo) que aparece na versão pianística torna a peça muito pesada, e a execução, mesmo que magistral como a de Luis Claudio, dá sempre a impressão de esforço excessivo para o resultado musical obtido.

O mesmo se pode dizer das peças originais para alaúde, como a Fantasia de Francesco da Milano e a Sonata de Giovani Zamboni Romano. Soam muito melhor no instrumento de época. Mas vale a pena a experiência de ouvi-las também em transcrição, e Luis Claudio faz as necessárias adaptações técnicas para que o violão soe mais próximo da técnica alaudística: capotasto, afinação e digitação adequadas.

Para mim o destaque da primeira parte foram as peças originais para o instrumento: uma peça da Suíte Homenage a Ravel de Jaime Zenamon e o Choro da Saudade de Agustín Barrios. Esta última foi o ponto alto do concerto solo. Luis Claudio “remixou” a peça para os graves soarem como devem no regional de choro. Fez isso obviamente usando apenas os recursos da técnica de execução do instrumento: correta dosagem de intensidade e timbre de cada nota, fazendo a linha do baixo soar cheia e encorpada, enquanto o acompanhamento de acordes no agudo soou leve e cristalino. Tudo com o necessário balanço, a demonstrar que, mesmo sendo uma peça de concerto, a obra de Barrios não deixa de ser um exemplar na música seresteira que o violão tão bem representava no início do século XX.

O quarteto ficou acima de qualquer possibilidade de crítica. Tudo soou fantástico, desde as peças originais para a formação (duas das 6 pequenas jóias de Jaime Zenamon) até as perfeitas transcrições do Concerto de Brandemburgo nº 6 de J. S. Bach, do Tanti Anni Prima de Piazzola e do Burrico de Pau de Carlos Gomes (4º movimento de sua Sonata para quarteto de cordas) – as duas últimas feitas por Fabrício Mattos.

Cada nota estava no lugar certo na hora certa com o timbre certo. Resultanto no equilíbrio perfeito de rara beleza. Mostrando o quanto o instrumento funciona bem na música de câmera. Em quarteto não se percebe nenhuma dificuldade na execução de transcrições, que soam tão bem quanto as obras originais.

E o Quarteto Ars, formado por notórios solistas que também sabem tocar em conjunto (como deveria ser todo bom solista), já aparece entre os grandes quartetos de violões, filhos de uma tradição já respeitável. Acredito que o primeiro quarteto com o instrumento foi formado por Caledônio Romero e seus filhos Celim, Pepe e Angel. Também muito tradicional é o Los Angeles Guitar Quartet – não sei se ainda ativo. No Brasil a tradição começou talvez com o Quarteto de Violões de Curitiba orientado por Orlando Fraga no final dos anos 80. Nos anos 90 o Quaternaglia de São Paulo surgiu no meio musical, seguido pelo Quarteto Rubio, hoje Quarteto de Violões de São Paulo. E não se pode esquecer o quarteto Maogani, fazendo explêndido trabalho com o repertório da música popular brasileira. Entre todos estes grupos fantásticos, o Quarteto Ars sem dúvida faz bela figura.


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